A Possibilidade Da Efetivação Dos Direitos Sociais Pelo Poder Judiciário

Discussão em 'Artigos Jurídicos' iniciado por Victor Romero, 05 de Outubro de 2011.

  1. Victor Romero

    Victor Romero Em análise

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    Sexo:
    Masculino
    Estado:
    Rio de Janeiro
    TÍTULO:



    A possibilidade da efetivação dos direitos sociais pelo Poder Judiciário


    AUTOR:



    Victor Manoel Romero da Silva



    RESUMO:




    Dentre os direitos humanos fundamentais destacam-se os direitos sociais os quais se relacionam aos flagelados sociais, aos miseráveis e marginalizados. Nossa Constituição Federal prevê expressamente esses direitos e cabe ao Poder Judiciário a guarda dessa "vontade" da Constituição através das ações que julga. Deve então efetivar estes direitos.





    I – INTRODUÇÃO


    Vivemos num mundo surpreendente. Atualmente, os meios de comunicações sociais divulgam a existência de grave crise econômica mundial acompanhada de conflitos políticos, étnicos e religiosos entre nações, onde a população civil, aos milhares, é morta num massacre permanente. Informam-nos de aumento das agressões ao meio-ambiente com incremento da poluição, aquecimento global e destruição de ecossistemas, colocando em risco a vida no planeta. Divulga-se, quase que diariamente, a corrupção atingindo níveis absurdos em quantidade de pessoas envolvidas, prejudicando os negócios e propiciando uma concentração de renda mundial nas mãos de poucos, em detrimento da miséria de muitos. Isso sem falar nas populações de continentes inteiros que estão mergulhadas na miséria, nas doenças e nos conflitos, sem perspectivas de mudança, o que nos indigna e desafia ao mesmo tempo.

    A par dessas crises, atesta-se facilmente que o mundo caminha para um desenvolvimento civilizatório, uma evolução social globalizada nunca antes imaginada e causada principalmente pela admirável evolução das ciências, da tecnologia e da economia mundial nos últimos anos, tornando a vida humana muito mais fácil no planeta. Recentemente inclusive divulgou-se que há a previsão de que os jovens deverão alcançar o centenário devido à evolução da ciência médica cada vez mais capaz de propiciar um envelhecimento digno.

    De forma contraditória, porém, como visto acima, este desenvolvimento econômico, o progresso cultural e a evolução social não são socializados ou solidarizados, não vem acompanhado pela efetivação dos direitos humanos fundamentais, patrimônio da humanidade desde a Revolução Francesa de 1789. Ao contrário disso, muitos países que consagram os direitos humanos em suas Constituições os desrespeitam acintosamente, seja de forma comissiva ou omissiva como a proclamar a inexistência ou a ineficácia de uma Constituição efetiva e dirigente.

    Dentre os direitos humanos fundamentais destacam-se os direitos sociais. Os direitos sociais são direitos que se relacionam aos excluídos sociais, aos miseráveis, as pessoas que precisam do Estado para concretizar direitos relacionados à vida, à saúde, à educação, à moradia, ao lazer e à cultura, pois são pessoas estão marginalizadas da sociedade. Os direitos sociais, se comparados aos direitos individuais, nasceram muito mais como normas declaratórias do que jurídicas, não tendo força normativa e eficácia concreta daí sua difícil implementação. Reflexo disso é que quando direitos como a liberdade e a propriedade são violados se desperta no cenário nacional e internacional uma grande reação organizada mas quando se fala de violação a direitos como saúde, educação, habitação, cultura etc não há muita mobilização social quanto a isso.

    No Brasil, a Constituição de 1988 ampliou de forma nunca visto antes a tutela dos direitos sociais. Nela, o direito a saúde deixou de ser serviço público discricionário para ser direito efetivo, diferente das constituições anteriores. Ela revolucionou em relação ao direito à educação, trouxe pela primeira vez o direito à moradia como um direito fundamental, avançou na previsão do direito ao lazer e da cultura e comprometeu todas as unidades federativas em competências comuns a respeito desses direitos. Ela inovou quando determinou como seu fundamento a cidadania e a dignidade da pessoa humana, quando declarou entre seus objetivos a solidariedade, a justiça e a erradicação das desigualdades sociais e quando previu várias ações constitucionais que possibilitam efetivação de seus preceitos programáticos e a tutela dos direitos sociais. A Constituição atual é uma Constituição comprometida com os direitos sociais elegendo a dignidade humana como grande principio norteador e prevendo meios concretos de efetivação. Nesse panorama, a Constituição Federal deu grande relevo ao Poder Judiciário. É um dos três Poderes da Republica e tem a responsabilidade direta pela guarda da Constituição. Mais que isso, quando o artigo 5º, XXXV da Constituição Federal prescreve que "nenhuma lei pode excluir da apreciação do Poder Judiciário a lesão ou ameaça de direito", o texto constitucional comprometeu os juizes em efetivarem a Constituição. Como conseqüência, comprometeu os juízes na implementação das políticas públicas, principalmente quando as políticas públicas não forem realizadas por quem deveria realizá-la ou quando há má prestação dos serviços públicos.

    Em um país em construção como o nosso, as políticas públicas são os atos, leis, diretrizes, programas que o Estado deve implementar para poder concretizar os direitos sociais que são garantidos na Constituição. Os direitos sociais são efetivados através das políticas públicas. São exemplos de Políticas Públicas a construção de hospitais, escolas, a compra de medicamentos, a contratação de médicos, a compra de merenda e livros escolares, a construção de um museu, a política estatal de incentivo ao mercado de trabalho. São ações concretas que visam efetivamente dar maior qualidade de vida principalmente aos hiposuficientes.

    A fiscalização e a implementação pelos juízes das políticas públicas atualmente é um assunto que desperta grande polêmica no país em geral e no meio jurídico em particular. Fala-se muito num indesejável e temido governo dos juízes ou num ativismo judicial devido a uma série de recentes e importantes decisões judiciais onde os juízes adotaram decisões ousadas.

    O objetivo do trabalho é investigar se, apesar de existirem outros Poderes da República responsáveis diretamente pelas políticas públicas, como o Poder Executivo e o Legislativo, conforme previsão constitucional, até que ponto o Poder Judiciário não está também comprometido com a efetivação das políticas públicas? Será que há legitimidade dos juizes para intervir nas políticas públicas? Será que a separação dos Poderes da República, com a correspondente separação de funções, previsto em nossa Constituição tira legitimidade do Poder Judiciário para atuar na implantação das políticas públicas? Tentaremos aprofundar o assunto tratado e responder essas e outras perguntas que surgirem no decorrer de nossa pesquisa e investigação.




    II - HISTÓRICO DOS DIREITOS SOCIAIS


    A noção de direitos fundamentais passou por alterações ao longo da história e daí decorrem as diferentes gerações, ou gestações dos direitos fundamentais. Classicamente, são três as gerações dos direitos fundamentais e historicamente a Revolução Francesa é a origem e o fundamento deles. Os direitos fundamentais de 1º Geração seriam os direitos de liberdade e propriedade e são direitos influenciados pelo valor da liberdade. Seriam os direitos individuais de ir, vir e ficar: o direito à segurança, o direito à propriedade, patrimônio etc. Os direitos fundamentais de 2º Geração seriam os direitos influenciados pelo valor da igualdade. Seriam os direitos sociais e visam à igualdade mesmo que utópica entre os trabalhadores, tais como a igualdade quanto à previdência social, a cultura, a educação o desporto etc. Os direitos fundamentais de 3º Geração seriam os direitos influenciados pelo valor da fraternidade ou solidariedade. Seriam os direitos difusos, tais como o direito ao meio ambiente equilibrado e sadio, o direito à paz mundial, o direito às telecomunicações, o direito ao patrimônio público etc. Modernamente, alguns autores sustentam a existência de uma 4º Geração de direitos fundamentais relacionados ao processo de globalização, tendo como exemplo o amplo acesso à informação e o direito à democracia etc.

    O conceito atual de Constituição como ápice do ordenamento jurídico e positivadora de direitos humanos só foi possível depois da consolidação do Estado Moderno e do surgimento da noção de soberania estatal. Na maioria dos países europeus, o Estado nacional só começa a se formar em meados do séc. XVI e final do séc. XV. Até então, não havia um poder único, não existia a idéia do Estado como titular do monopólio e do uso legítimo da força, centro único de produção de normas jurídicas, mas, ao contrário, o poder era fragmentado e desconcentrado.

    Com a unificação do Estado vem à tona um movimento cujas conseqüências irradia-se até hoje, o Iluminismo, e que foi um dos responsáveis pela unificação dos Estados Nacionais. O Iluminismo foi uma filosofia racionalista, buscava libertar o homem da tradição, do preconceito e alicerçar todo conhecimento humano na razão. O Iluminismo era essencialmente uma filosofia antropocêntrica, quer dizer, uma filosofia que centrava as suas preocupações na figura do homem, diferentemente do pensamento até então em que o centro das preocupações a religião. Para proteger o homem e potencializar os valores humanitários, que eram o objetivo do iluminismo, era preciso, antes de tudo, limitar esse poder estatal que era um poder absoluto quando o Estado nacional se formou. O chamado Estado Absolutista se confundia com a figura do rei monarca que não conhecendo limites jurídicos, e sua atuação invariavelmente atropelava os direitos humanos.

    Esse foi o nascimento do constitucionalismo que foi a expressão jurídica da preocupação com a proteção dos direitos humanos fundamentais. Para isso, a idéia era de criar uma determinada estrutura para o Estado, de tal sorte que ele não pudesse violar os direitos humanos. A tripartição e a separação de poderes surge para dividir o exercício do poder e com isso nenhum poder vai se sobressair e controlar os outros poderes e assim não permitir que os direitos do homem sejam violados. Além disso, o Estado vai ser limitado através da definição e positivação dos direitos fundamentais, que vão consistir em barreiras protegendo a autonomia privada da intervenção indevida do poder público. Esses direitos, nesse primeiro momento, vão consistir em deveres de abstenção estatal, o Estado vai garanti-los, vai protegê-los se omitindo, deixando de agir. Então o surgimento do chamado Estado Mínimo foi quase que uma conseqüência dessa visão dos direitos humanos. O Estado se restringia ao desempenho de tarefas muito limitadas, ele protegia somente a propriedade, a segurança interna e externa. Com o passar do tempo foi se tornando claro que aquele modelo de Estado absenteísta, ausente, não bastava. O Constitucionalismo Liberal ao proteger apenas a propriedade privada, ao criar o arcabouço institucional necessário para o desenvolvimento apenas do comércio, da indústria e da atividade econômica como um todo, permitiu que o capitalismo se tornasse um capitalismo selvagem e desumano, com a injusta exploração econômica do homem como se fosse mercadoria. Naquela época, mulheres e crianças trabalhavam até 18 horas por dia com um salário miserável, sem nenhuma proteção da sociedade e do Estado.

    A Constituição até então era concebida apenas como uma limitação ao poder estatal. O papel das Constituições era estruturar o Estado e fortalecer o elenco de garantias individuais que impedissem que o Estado violasse as liberdades do homem, um papel relativamente reduzido. As Constituições eram apenas contenções ao poder estatal. Ora, com essas novas necessidades, essas novas demandas da sociedade, o Estado teve que crescer para atendê-las. Com esse crescimento o Estado abdicou do papel de mero espectador dos conflitos distributivos que se travavam no seio da sociedade civil e foi paulatinamente assumindo a função de regulador do mercado, de protagonista, inclusive do processo econômico.

    Por outro lado, os direitos que as pessoas tinham em face do Estado foram também se alterando. Se até então os direitos humanos eram um direito a abstenção do Estado, com esse novo paradigma vão surgir outros direitos positivos, direitos cuja prestação vai consistir numa atuação comissiva, ativa, do poder público, como por exemplo, o direito à saúde, educação, previdência social, etc. São pretensões que demandam do poder público um crescimento, que demandam atuações positivas que para serem concretamente desempenhadas, necessitam de um Estado maior.

    Foi essa a gênese do chamado Estado do Bem Estar Social, o qual projetou conseqüências extremamente importantes na compreensão do que é uma Constituição preocupada com a justiça. Se a Constituição, até então, regulava apenas as relações jurídicas entre cidadão e Estado, agora a Constituição passou a se ocupar com a sociedade. Então, o Estado vai passar também a agir para proteger o homem do próprio homem e com isso nós vamos ter o surgimento do direito social, do direito do trabalho a constitucionalização dos direitos privados. A Constituição passa também a ser o epicentro do ordenamento jurídico, o centro gravitacional em torno do qual giram todos os demais ramos do direito.

    O novo conceito que corresponde ao Estado do bem estar social e a mudança no paradigma do Estado se refletiu na modificação do conceito de Constituição. A Constituição não é mais aquela norma que disciplina apenas as relações entre cidadão e Estado e que por isso tinha que ser mínima. A Constituição do Estado do bem estar social é ambiciosa, ela pretende ir além, estabelecendo metas e prescrevendo objetivos que as forças políticas vão ter que cumprir. Nasceram principalmente através das Constituições Mexicana, Soviética e Alemã.

    Por fim, para alguns estudiosos, após a segunda grande guerra mundial, sobreveio a instituição de uma outra forma de Estado que é o Estado Democrático de Direito, que no Brasil se materializou, ao menos formalmente, na Constituição de 1988. Mas afinal, o que é o Estado Democrático de Direito? O Estado Democrático de Direito é concebido com base em dois fundamentos: respeito aos direitos fundamentais e sociais e democracia.

    O Estado Democrático de Direito é, portanto, uma evolução em relação ao Estado Social, na medida em que o Direito é visto com instrumento necessário à implantação das promessas de modernidades não cumpridas pelo Estado Social. Desta forma, há um inevitável deslocamento do centro de tensão e decisão dos Poderes Legislativo e Executivo para o Poder Judiciário com a Jurisdição Constitucional.

    O Estado Democrático de Direito e Constituição Dirigente são conceitos e institutos intimamente ligados; são instrumentos garantidores da conformação dos poderes constituídos com a finalidade precípua de implementarem as promessas de uma igualdade material. O Direito, portanto, assume relevante papel nessa empreitada, na medida em que é o instrumento de conformação social, frente à inércia dos outros poderes. Por outro lado, antiga separação de poderes de índole iluminista está em crise porque as urnas não possuem hoje um papel único de fonte de legitimação democrática do poder. Democracia e representação popular não são expressões sinônimas, pois a primeira significa antes de tudo vontade popular.

    Em relação aos direitos sociais, tema específico do trabalho, é necessário fazer uma abordagem sobre toda a problemática que os envolvem. Os direitos sociais são direitos que se relacionam aos hiposuficientes, que são pessoas que precisam do Estado para que possam concretizar direitos humanos relacionados à igualdade, pois estão à margem da sociedade. Mas não a uma igualdade puramente formal, que já era ideário da Revolução Francesa de 1789 que revolucionou a história da humanidade quanto ao reconhecimento dos direitos humanos, mas uma igualdade em um aspecto mais profundo, uma igualdade que é traduzida numa melhor qualidade de vida para as todas as pessoas com relação à saúde, a moradia, educação, lazer e a cultura, principalmente para aqueles que dependem do Estado para que possam concretizar essa igualdade.

    O fato é que até hoje em nosso país esses direitos não foram implementados. A população, em sua grande maioria, continua morrendo nos hospitais públicos devido ao atendimento médico deficiente e a falta de saneamento básico, a cultura existe apenas para uma elite social e mesmo o acesso à justiça é privilégio apenas de uma classe social, pois para sua implementação são necessários informação e educação, direitos sociais que também não são acessíveis a todos. Por outro lado, a Constituição de 1988 quis um bem estar social para todos e não apenas para a elite, se qualificando como uma Constituição compromissória, preocupada ainda que formalmente com todos os seus cidadãos. Disso trata-se a seguir.



    III – A CONSTITUIÇÃO E OS DIREITOS SOCIAS



    A Constituição de um país pode ser definida como o sistema de normas, regras e princípios jurídicos escritas ou consuetudinárias que regulam a forma de Estado, a forma de Governo, o modo de aquisição e exercício do poder, o estabelecimento dos seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos e garantias fundamentais e a ordem econômica e social. O objetivo maior do Direito Constitucional é o que se chama de "filtragem constitucional". Isso quer dizer que todas as espécies normativas do ordenamento jurídico devem existir, serem consideradas como válidas e analisadas sempre sob a luz da Constituição Federal. Através dessa observância é que se afere se elas são ou não constitucionais. É nesse momento que entra o controle de constitucionalidade, para observar se as leis e normas estão compatíveis com a Carta Magna.

    O controle de constitucionalidade é um dos temas mais sensíveis de teoria da Constituição, pois envolve em profundidade a questão democrática. O controle de constitucionalidade dá a quem não é eleito o poder de afastar as decisões tomadas pela maioria, pelos representantes do povo. A idéia é colocar certas decisões fundamentais ao abrigo mesmo das paixões das maiorias. Aqui percebemos que o Poder Judiciário é chamado a uma importante missão em nossa República.

    A única justificativa democrática do controle de constitucionalidade é a proteção das minorias. Democracia não é o governo das maiorias, é o governo das maiorias que respeitam os direitos das minorias. Sem controle de constitucionalidade as maiorias podem esmigalhar as minorias. Por isto, este tema, como qualquer instituto do direito constitucional, só pode ser bem compreendido à luz dos direitos fundamentais que é o núcleo de qualquer ordem constitucional, pois a Constituição nasce da necessidade de proteger o homem.

    Para a doutrina tradicional, os destinatários dessas normas não podem exigir do Estado a sua imediata aplicação. Para ela, as normas de conteúdo programático apenas vinculam negativamente o Estado, que, no desempenho de suas diversas funções, não poderá contrariar tais normas. O Estado só poderá criar leis compatíveis com as normas programáticas. No desempenho da função administrativa, o Estado deverá, porém, priorizar a materialização das normas programáticas, mas elas não teriam eficácia plena e imediata.

    A nossa Constituição de 1988 inovou bastante quanto aos direitos humanos. Nas constituições anteriores não havia títulos constitucionais sobre direitos e garantias fundamentais e que pudessem hospedar como faz a Constituição de 1988, os direitos individuais, coletivos, sociais, relativos à nacionalidade e partidos políticos e políticos. Antes da Carta de 1988, a expressão direitos e garantias fundamentais era utilizada, pelas Constituições passadas, como sinônimo de direitos individuais. Então, direitos individuais, direitos fundamentais, liberdades públicas, direitos humanos, etc., eram expressões sinônimas porque indicavam o mesmo instituto, o mesmo fenômeno jurídico. A Constituição de 1988 desde logo instituiu o título II, no qual o legislador constituinte originário hospedou os direitos individuais e coletivos, sociais, da nacionalidade, políticos e de existência, organização e participação dos partidos políticos.

    Os direitos fundamentais são aqueles considerados indispensáveis para uma vida digna em sociedade. Eles são tratados no texto constitucional como forma de garantia de uma maior proteção em razão da rigidez constitucional, ou então, para que sejam preservados através da cláusula de imutabilidade. São as chamadas cláusulas pétreas, previstas no art. 60 § 4º da Constituição atual, que prescrevem que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; os direitos e garantias individuais.

    O Princípio da Efetividade dos Diretos Fundamentais ou da Aplicabilidade Imediata dos Direitos Fundamentais está consagrado no art. 5º, § 1º da Carta Magna, que prescreve que "as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata". Essa aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais deve ser entendida como uma diretriz exegética para o intérprete buscar extrair da norma a maior carga de efeitos que ela pode dar. Então, o intérprete diante de uma norma constitucional especial que consagra direito fundamental deve pensar no que ele pode fazer para tirar daquela norma o máximo de efeitos possíveis.

    O grande problema da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais diz respeito aos direitos sociais de conteúdo prestacional. Com relação aos direitos individuais de defesa, tem se entendido que a aplicabilidade imediata vale incondicionalmente, como é o caso do Mandado de Injunção. Quanto aos direitos sociais o foco da questão é que são direitos que dependem de prestações, dependem também de recursos. O problema é que os recursos são limitados e a visão clássica é de que, no quadro de escassez, as escolhas ou prioridades devem ser feitas não pelo Poder Judiciário em suas sentenças, mas por poderes que têm legitimidade conseguida da vontade popular direta, através das eleições, como o Poder Legislativo e o Poder Executivo. Até por que, constitucionalmente o Legislativo faz o orçamento e o Executivo executa o orçamento.

    Com isso, a concepção tradicional, negava eficácia imediata aos direitos fundamentais prestacionais afirmando que os direitos individuais eram exigíveis e que os direitos prestacionais não eram, dependeriam de legislação. Essa é a visão que durante muito tempo prevaleceu e que está ligada com uma certa equiparação dos direitos sociais às normas programáticas, e a leitura de normas programáticas como normas que possibilitam que se oponha a uma conduta do Estado, mas não que se exija uma prestação a partir dela.

    No entanto surgiram outras compreensões em relação à questão. Uma tese existente afirma que mesmo nos direitos prestacionais, que estão consagrados de forma mais abstrata, como saúde, moradia, em que o texto constitucional não define a prestação, existe um mínimo de direitos que deve ser tutelado, um mínimo existencial, e que somente o que ultrapassar esse mínimo vai depender de lei, vai depender de ato da administração com previsão no orçamento, ou seja, vai ficar ao sabor das autoridades políticas, mas o mínimo está garantido.

    A idéia da existência do mínimo existencial neutraliza algumas das alegações feitas contra a eficácia dos direitos prestacionais. Por exemplo, uma das alegações que se faz é que essa concepção de dar ao Poder Judiciário a tutela dos direitos prestacionais gera uma concepção antidemocrática de Governo de Juízes, de forma que o Poder Judiciário vai começar a interferir nas escolhas das prioridades dos gastos, das políticas públicas, o que não é democrático nem republicano.

    Só que a concepção contemporânea de democracia afirma que a democracia pressupõe o mínimo, que o governo democrático não é só o governo em que ocorram eleições periódicas, mais do que isso existem pressupostos para essa democracia, e, dentre estes pressupostos, estaria a existência do mínimo existencial para que se possa participar conscientemente do debate democrático. Assim se o mínimo é pressuposto da democracia assegurá-lo não pode ser contrário à democracia, o que neutraliza a crítica democrática. Esse argumento neutraliza de certa maneira também a crítica liberal uma vez que a liberdade só pode ser assegurada quando há o mínimo de condições materiais para isso.

    Por outro lado, a efetividade dos direitos na Constituição é máxima por natureza e assim não haveria motivo para se falar em mínimo em relação ao direito social. Será que essa tese do mínimo existencial não traz uma hierarquização em que se coloca antes os direitos individuais e depois os direitos sociais num retorno ao individualismo egoísta de outrora? Na verdade, o problema da aplicabilidade dos direitos sociais pode ser equacionado através de uma ponderação em que de um lado coloca-se o direito social e do outro lado a justiça e a democracia.

    No lugar do direito social pode-se colocar a dignidade humana. Para a realização da dignidade da pessoa humana é essencial a efetivação dos direitos sociais. Assim o problema do mínimo existencial é muito importante, mas não é o único critério.

    Alguns chegam a defender a construção do novo conceito de discricionariedade baseado na teoria do Garantismo Jurídico. Existe uma divergência entre a normatividade e a efetividade, e o garantismo seria forma de fazer a junção entre elas, garantindo os direitos humanos. Isso vai implicar na necessidade de que só seja permitido ao agente público fazer uso da discricionariedade a partir do momento em que a Administração tiver satisfeito as necessidades básicas dos cidadãos, ou seja, a garantia do mínimo necessário à sua dignidade, representado pelo atendimento aos direitos fundamentais. Com isso, assegurar o mínimo necessário à dignidade humana significa atender às demandas geradas pelos direitos fundamentais das populações, especialmente as mais pobres, e que se constituem nas principais destinatárias das políticas públicas para suprir necessidades vitais de sobrevivência minimamente digna. Do ponto de vista de uma visão garantista do controle da Administração, dado que esta deve atuar, em todos os momentos, tendo a pessoa como centro de suas realizações, cabe ao Judiciário a avaliação dos atos administrativos, sempre sob a perspectiva dos direitos fundamentais constitucionais.

    Se, não é possível transferir para o Poder Judiciário a possibilidade de escolher quais políticas públicas são as mais importantes, por outro lado ele é tão legitimado quanto os outros Poderes para a efetivação dos direitos fundamentais. A idéia dos direitos fundamentais é a concretização do meta-valor da dignidade da pessoa humana, isto é, tratar o homem sempre como fim e nunca como meio, o homem como valor fonte de todo o ordenamento jurídico e o Poder Judiciário é o guardião dele.




    IV - O PODER JUDICIÁRIO.



    Verdadeiramente o poder político no Estado, apesar de ser tripartido, é uno e indivisível. Há apenas um poder político, que é o poder do Estado, que é o poder revelado na ordem jurídica com força de constranger à obediência, de coordenar e impor uma decisão. Mas esse poder político do Estado tem três funções básicas: a legislativa, a executiva e a jurisdicional. O poder Legislativo se encarrega de gerar a lei, o Executivo, da atividade administrativa e o Poder Judiciário, da jurisdição, resolvendo conflitos. A rigor não existe, portanto, divisão de poderes, mas de funções que para serem exercitadas há necessidade de criação de poderes através de órgãos, mas o Poder é um só: uno, indivisível, imprescritível, etc. E essas funções são, em regra indelegáveis, na idéia da existência da repartição constitucional de competências.
    O Poder Judiciário é órgão fundamental na formação de um Estado Democrático de Direito, pois cabe a ele, com autonomia e independência, velar pela guarda da Constituição, especialmente pela observância dos princípios da igualdade e da legalidade. De fato, seria inimaginável um Estado Democrático de Direito sem um Poder Judiciário independente, com a relevante função de administrar a Justiça, como fiscal da aplicação da Constituição e das Leis. Por outro lado, o Poder Judiciário é apontado por parte da doutrina como verdadeiro direito fundamental dos cidadãos, pois a estes é assegurado o direito de ser julgado por Juízos e Tribunais independentes e imparciais. A espinha dorsal do sistema judicial brasileiro muito dela é cláusula pétrea e baseada no princípio da unidade da jurisdição, inafastabilidade do controle jurisdicional, garantias da magistratura e independência do Judiciário.

    Antigamente, com o Estado Liberal, o Poder Judiciário não tinha muitos poderes, nem muitas atribuições sendo apenas um órgão subsidiário do Estado e praticamente não interferia na sociedade. Com a Constituição de 1988 o Poder Judiciário ficou fortalecido. A partir desse momento, esse Poder passou a ficar em pé de igualdade com os demais poderes e, conseqüentemente, passou a controlar todos assuntos da sociedade e por isso passou a ser mais procurado.

    A atual Constituição incrementou o Judiciário, reforçou suas garantias, dotou tal poder de uma série de instrumentos e mecanismos que visam possibilitar umas prestações jurisdicionais independente, imparciais e insubmissas à vontade dos donos do poder. Não há paralelo em outras Constituições, já que o nosso sistema é o que mais reforça a magistratura. As garantias funcionais e as garantias institucionais dos magistrados são amplas: inamovibilidade, vitaliciedade e irredutibilidade de subsídios, o autogoverno etc. Esse último permite que o Judiciário escolha seus dirigentes, e é por isso que o presidente do Supremo Tribunal Federal é escolhido por ele mesmo e os chefes dos órgãos dirigentes dos tribunais são escolhidos por cada tribunal.

    Pelo visto acima, o Poder Judiciário tem base para atuar na efetivação dos direitos sociais pois, além de contar com a legitimidade Constitucional direta, como visto acima, há a legitimidade indireta, pois a seleção dos juízes é por concurso público, um mecanismo eminentemente democrático. Não se pode esquecer que os juízes dos tribunais superiores são escolhidos pelo Poder Executivo e referendados pelo Senado Federal, fora diversos mecanismo de participação da sociedade no poder judiciário como a figura do amicus curiae, na composição popular do CNJ, o quinto constitucional composto por advogados e a participação popular nas súmulas vinculantes. Outro eficiente meio de controle da atividade do Poder Judiciário é na obrigatoriedade da fundamentação de suas decisões o que permite um controle por outros juízes, por outras instâncias e pela própria sociedade garantindo uma decisão justa e democrática.



    V - OS PRINCÍPIOS



    Atualmente os princípios jurídicos tiveram reconhecido seu grau de juridicidade. Ou seja, deixaram de desempenha um papel secundário para passar a cumprir o papel de protagonistas do ordenamento ganhando reconhecimento de seu caráter de norma jurídica potencializada e predominante. Tanto que a doutrina prescreve que violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais.

    É inegável que os princípios possuem positividade e vinculatividade o que lhes confere a qualidade de normas que obrigam e possuem eficácia positiva e negativa sobre comportamentos públicos ou privados bem como sobre a interpretação e a aplicação de outras normas, tais como as regras, ou mesmo os princípios derivados de princípios mais abstratos.

    Historicamente, a normatividade dos princípios jurídicos perpassa por três distintos capítulos: o jusnaturalismo, o juspositivismo e o pós-positivismo. O jusnaturalismo moderno inicia sua formação a partir do século XVI. E tal escola tinha por objetivo deixar para traz o dogmatismo medieval, bem como escapar do ambiente teológico em que se formou e desenvolveu. Na fase jusnaturalista, os princípios ocupavam uma função meramente informativa (para valorar como certo ou errado, conforme a norma de direito positivo se conformasse ou não às diretrizes dos princípios), mas sem qualquer eficácia sintática normativa. Nesta fase os princípios jurídicos eram situados em esfera metafísica e abstrata, sendo reconhecidos como inspiradores de um ideal de justiça, cuja eficácia se cinge a uma dimensão ético-valorativa do Direito. Tamanha foi a influência histórica da escola jusnaturalista que, já no século XIX, com o advento do Estado Liberal muitos dos preceitos seguidos pelos jusnaturalistas foram incorporados em textos escritos. Era a superação histórica do naturalismo.

    Com a promulgação dos Códigos, principalmente do Napoleônico, o Jusnaturalismo exauria a sua função no momento mesmo em que celebrava seu triunfo. Transpondo o Direito racional para o Código, não se via nem admitia outro direito senão este. O recurso a princípios ou normas extrínsecos ao sistema do direito positivo foi considerado ilegítimo. Surgia o positivismo. Nesta fase, tinha-se a pretensão de criar uma Ciência Jurídica com objetividade científica e características similares das conferidas às Ciências Exatas. Apartava-se, assim, o Direito da Moral, de modo a inserí-los em compartimentos estanques para fins científicos.

    O grande impacto do positivismo e o culto velado a seus dogmas legitimou, ainda que sob vestes travestidas, a feitura de autoritarismos dos mais diversos. Esses movimentos políticos e militares ascenderam ao poder dentro do quadro de legalidade vigente e promoveram uma barbárie em nome da lei. A queda do Positivismo coincide com uma época em que o homem passou a se preocupar mais com os direitos sociais, atribuindo uma dimensão superior à necessidade de se solucionar conflitos independentemente das leis, viu-se que não é sempre que a lei é legítima, ou seja, que a norma corresponde à vontade social.

    Era o início do pós-positivismo jurídico. A nova fase passou a atribuir maior importância não somente às leis, mas aos princípios do direito. E os princípios, analisados como espécies de normas, tinham, ao contrário das regras, ou leis, um campo maior de abrangência, pois se tratavam de preceitos que deveriam intervir nas demais normas, inferiores, para obter delas o real sentido e alcance. Tudo se ressalte, para garantir os direitos sociais do homem. No pós-positivismo, os princípios jurídicos deixam de possuir apenas a função integratória do direito, conquistando o status de normas jurídicas vinculantes.

    A superação histórica do Jusnaturalismo e o fracasso político do Positivismo abriram caminho para um conjunto amplo e ainda inacabado de reflexões acercado do Direito, sua função social e sua interpretação. O Pós-Positivismo é a designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da chamada Nova Hermenêutica Constitucional, e a teoria dos direitos fundamentais, edificada sobre o fundamento da dignidade humana. A valorização dos princípios, sua incorporação explícita ou implícita pelos textos constitucionais e o reconhecimento pela ordem jurídica de sua normatividade fazem parte desse ambiente de reaproximação entre Direito e Ética.

    Os princípios têm uma dimensão de peso de tal forma que quando dois princípios incidirem sobre o caso concreto e apontam em direções diferentes, o intérprete não é necessariamente forçado a escolher por um princípio em detrimento do outro. Com princípios não há propriamente antinomia. Existem tensões entre princípios que se equaciona através de uma ponderação. O princípio não define de antemão, ao contrário da regra, quais são as hipóteses em que ele vai incidir. A regra permite uma subsunção do fato à norma, ao contrário do princípio. A característica dos princípios é que eles são fluidos, têm um teor mais aberto, permitem arejar o direito, permitem que ele se adapte às mudanças que ocorrem na sociedade, humanizam a aplicação do direito e tornam mais relevante o papel do intérprete.

    Os princípios estão associados a direitos. Os princípios são instrumentos que permitem uma leitura moral da Constituição. Moralidade da Constituição vem, sobretudo, em virtude dos princípios. São exemplos de princípios em sentido amplo as diretrizes políticas e os direitos previstos nas constituições.

    Eles são um mandado prima facie, isto é, a resposta dada por eles não é necessariamente a resposta definitiva, eis que você pode perquirir que outros princípios incidem, ponderar, aquilatar diante das circunstâncias específicas que cercam o caso concreto qual a melhor solução. As regras, ao contrário, são comandos definitivos. Assim, pensar em princípio seria pensar em proporcionalidade, a resolução de conflitos principiológicos se resolve através de uma ponderação que vai se pautar na proporcionalidade.

    Uma Constituição que contivesse apenas regras não iria ter a maleabilidade suficiente para acomodar todas as infinitas variações do fato social. Por outro lado, uma Constituição que contivesse apenas princípios seria tão abstrata que geraria um clima de permanente insegurança jurídica. Os princípios acabam permeando a interpretação da regra. Todavia, o processo não é unilateral, no sentido de extrair as regras dos princípios. É um processo de esclarecimento recíproco, no qual você interpreta a regra à luz do princípio do qual ela decorre e por outro lado, o sentido do princípio é informado pelo conteúdo das regras que constituem os seus desdobramentos.

    O importante é mostrar como é que a aplicação de um princípio envolve uma margem de indeterminação, de maleabilidade, muito maior. Só que não é subjetividade pura, não é arbítrio, exige o emprego da racionalidade prática, é argumentação jurídica, é uma lógica que não se confunde com a lógica matemática da subsunção. O que se deve observar é que nem princípio é menos nem princípio é mais. Regra é muito importante, já que o ordenamento jurídico precisa de segurança, previsibilidade.

    No Brasil, o marco zero desse novo Direito que privilegia os princípios constitucionais sobre a regra posta, que fez com que todo o ordenamento jurídico passasse a ser analisado à luz da Constituição Federal, foi a Constituição de 1988. A carta passou a ser o centro do sistema jurídico, ocupando o trono de onde, até então, reinava o Código Civil. Em outros países, como a Alemanha, essa mudança começou a ser construída antes, no pós-guerra.

    No novo patamar da Constituição, o juiz deixa de ser apenas "a boca que pronuncia a lei", como um ser inanimado, e passa a aplicar à legislação as garantias fundamentais das pessoas. Conceitos como o jusnaturalismo (o homem tem direitos naturais que não dependem de leis para serem respeitados) e o positivismo (o direito é somente aquilo que diz a lei) quase saíram de circulação. Em seus lugares, surge o pós-positivismo, que é o fenômeno jurídico que hoje presenciamos. Sem desprezar a lei, o juiz a interpreta tendo como norte a Constituição, naqueles casos em que se entende que o direito não cabe integralmente na norma legislada. Os grandes valores da humanidade migram para o mundo jurídico pela porta dos princípios constitucionais reaproximando a ética e o direito. Neste caso, o juiz é participante do processo de construção do direito.

    As teorias tradicionais não estão derrotadas, mas não são suficientes para resolver os graves problemas sociais presentes na realidade. Devido ao Constitucionalismo Democrático o Judiciário é agora chamado a impor, não a sua vontade, mas a vontade da Constituição aos agentes eleitos dos outros poderes da República para essas obrigações. A Constituição, nesse modelo, desempenha o papel de assegurar as regras do jogo democrático, propiciando participação política ampla e o governo da maioria e proteger valores e direitos fundamentais,

    Os princípios da Dignidade da Pessoa Humana, do Mínimo Existencial Humano, da Máxima Efetividade da Constituição, Força Normativa da Constituição, da Juridicidade e da Reserva do Possível são princípios explícitos e implícitos em nossa Constituição.

    Quanto ao princípio do mínimo existencial, o principio corresponderia ao conjunto de situações materiais indispensável a existência humana digna, considerada não apenas como sobrevivência física mas também espiritual, intelectual e outros aspectos humanos fundamentais de um estado de direito. É como se todas as pessoas tivessem direito ao mínimo de direitos fundamentais necessários a uma vida digna e o fundamento axiológico deste principio é a dignidade da pessoa humana.

    O principio da reserva do possível surge a partir das necessidades humanas infinitas frente aos recursos limitados para essa satisfação. No caso, a ponderação judicial precisa considerar o que é economicamente viável a ser prestado pelo Estado. O princípio é formado pelo binômio razoabilidade da prestação somado a existência de disponibilidade financeira do Estado para tornar efetivos as prestações positivas dele emanadas. Importante asseverar que o principio não configura óbice ao implemento das políticas sociais pelo Poder Judiciário, salvo se o Estado conseguir comprovar a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível.

    Quanto ao principio da vedação ao retrocesso social, a vontade do Estado deve prevalecer pois é ente permanente, e não a vontade do Governo, temporário por natureza. As políticas públicas são direitos públicos subjetivos como, por exemplo, o programa do atual governo federal conhecido por Bolsa- família de ajuda a milhões de famílias carentes, o programa Farmácia Popular e outros programas sociais. Expressa a idéia de que uma vez obtido um determinado grau de realização dos direitos sociais eles passariam a constituir simultaneamente uma garantia constitucional e um direito subjetivo que impediriam que novos governantes anulassem, ou revogassem conquistas sociais. Como os destino do país não é previsível e como a administração pública precisa de liberdade para conduzir o país, obviamente não se trata de um principio absoluto.

    Sobre o principio da máxima efetividade, ou força normativa ou juridicidade, esses princípios tem uma carga axiológica comum, tendo em vista que defendem a eficácia direta e imediata de todos os dispositivos presente na Constituição, inclusive os que possuem conteúdo programático. O principio da juridicidade é formado por uma legalidade material com suas regras e principio em substituição a uma visão mais conservadora do direito alinhada a legalidade em sentido formal. Não se pode mais ter uma leitura rígida da separação de poderes. Deve haver uma preocupação com a Justiça.



    VI – CONCLUSÃO



    Os direitos humanos experimentam uma situação contraditória nesta atual fase do Direito, pois adquiriam inusitada força normativa mas são ameaçados de todos os lados. Afirmaram-se como baliza da legitimidade institucional, mas sofrem rudes golpes de globalização econômica. Exemplo disso é que, se por um lado, atualmente, existe uma grande preocupação na tutela da dignidade da pessoa humana, por outro, evidenciam-se lesões de toda ordem que aviltam a dignidade humana.

    Vivemos, inclusive, um momento histórico em que o paradigma de Constituição preocupada com as questões sociais está sendo questionado devido à crise do Estado do bem estar social e a erosão na idéia da soberania do Estado. O Estado não é mais todo poderoso, pois o poder do Estado vem se deslocando para instâncias supraestatais ou infraestatais. Retoma-se de certa maneira a idéia de pluralismo político, de fontes não estatais de produção de normas e de solução de conflitos como, por exemplo, as Cortes Internacionais como a Comunidade Européia, o Tribunal Penal Internacional, Mercosul etc.

    Há uma certa perplexidade no direito constitucional porque as estruturas teóricas sobre os quais a disciplina foi edificada estão se transformando devido a uma série de transformações políticas, econômicas, sociais, que está ocorrendo no mundo contemporâneo. Hoje existe uma revisão da noção de Constituição dirigente e da crença nas normas programáticas dirigidas as classes desfavorecidas. Por exemplo, o professor José Joaquim Gomes Canotilho que criou o termo Constituição Dirigente, chegou a publicar um artigo com o título "A Constituição Dirigente morreu".

    Ora, obviamente isso tudo reflete no desenho atual de Constituição. Será que ainda é possível compreender à Constituição como lei suprema, lei acima de tudo que não estaria sujeita a limites de qualquer ordem? Para muitos a idéia de Estado soberano já se foi, a Constituição soberana não existe mais, não existe um poder que está acima de qualquer outro numa comunidade internacional como a nossa.

    Porém, por incrível que pareça, uma certeza que essa atual e grave crise econômica trouxe foi que não podemos abdicar de um Estado forte e interveniente. Em todos os países a unânime solução para essa grave crise econômica que acomete o mundo está na intervenção do Estado na economia estatizando empresas e instituições financeira e fomentando a produção e o consumo em seus países. Essa impensável intervenção do Estado na economia nos dias de hoje simboliza para alguns estudiosos o fim do Estado neoliberal.

    A frase dita por Canotilho deve ser entendida no contexto anterior a crise econômica de busca de ausência do Estado, ou do Estado mínimo na sociedade e teve como conseqüência a pior crise econômica desde 1929. A globalização econômica é regida apenas por imperativos de mercado, e a história já nos provou muitas vezes que mercado livre não é suficiente para proteger o homem pois quando o mercado regula a sociedade acaba sempre que o mais forte explora o mais fraco, desorganizando a sociedade.

    Na verdade, os valores que estão presentes no conceito do Estado de Bem Estar Social e do Estado Democrático de Direito são os valores humanitários, direitos humanos fundamentais, como igualdade, liberdade, justiça e fraternidade e eles são conquistas de muitas lutas da humanidade através dos séculos e nunca vão perecer. A dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos do Estado brasileiro, representa significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor fonte que conforma e inspira a Constituição e ordenamento jurídico dos Estados contemporâneos. Nesse sentido, as normas programáticas de uma Constituição não são simples programas, exortações morais, sentenças políticas, mas as normas programáticas possuem valor jurídico constitucional idêntico às outras normas constitucionais. Vinculam o legislador, na medida em que são uma imposição constitucional, servindo como diretivas materiais, vinculando todos os órgãos concretizadores não sendo apenas limites negativos.

    Como conseqüência, podemos destacar que a legitimidade dos juizes no Brasil para atuar nas políticas públicas a partir das normas programáticas é constitucional. São argumentos favoráveis o art. 5º, XXXV que prescreve que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito" e sua responsabilidade em implementar a Constituição, efetiva e eficaz por natureza. Configura também legitimação democrática do Poder Judiciário para atuar nas políticas públicas o fato da nomeação de membros dos Tribunais Superiores ser realizada por aqueles que são eleitos democraticamente, inclusive sendo sabatinados por órgãos colegiados do Congresso Nacional; o quinto constitucional que traz representantes da sociedade para os Tribunais e os concursos públicos, grande instrumento de efetivação do principio da igualdade e mérito que dão legitimidade indireta aos juízes. Pluralizam também o debate constitucional acerca das políticas públicas o papel do amicus curiae no controle concentrado de constitucionalidade, na edição de súmula vinculante e na edição de repercussão geral; as audiências públicas no Supremo tribunal Federal; as visitas in loco pelos juízes do STF, como no caso o julgamento da delimitação da reserva Raposa do Sol e o Conselho Nacional de Justiça, órgão de fiscalização do Poder Judiciário, cuja composição tem participação da sociedade. Por fim, um importante instrumento de balizamento e controle da atuação jurídica é a argumentação jurídica que deve ser desenvolvida adequadamente e com razoabilidade pelos juizes em suas decisões.

    Em relação ao Ativismo Judicial, a realidade é que o Brasil vive nos últimos 20 anos a paralisia dos Poderes Executivo e Legislativo e isso é responsável pelo atual protagonismo do Poder Judiciário. A rigor, o Poder Legislativo hoje não cumpre nenhum dos seus três papéis institucionais: não legisla, não fiscaliza o Executivo e representa mal o povo. O poder Executivo, por seu lado, constantemente está envolvido em corrupção e gestão ineficiente. E, na medida em que o assunto está previsto na Constituição, ele sai da esfera política, da deliberação parlamentar, e se torna matéria de interpretação judicial. Então, em uma primeira abordagem, a Constituição de 1988 contribuiu para que o Judiciário tenha um papel muito mais ativo na vida do país. Mas há um segundo motivo para isso, pois o atual sistema político brasileiro levou a um descolamento entre a sociedade civil e a classe política.

    Por outro lado, a Constituição de 1988 foi farta em prever instrumentos de correção e implementação dos direitos sociais nela previstos. As Ações Constitucionais, os Remédios Constitucionais e a aplicações dos Princípios Constitucionais são meios jurídicos para a concretização da Constituição. O que falta é uma maior consciência do papel que a Constituição assume no ordenamento jurídico, bem como do papel do Judiciário frente a não implementação e na realização dessa mesma Constituição.

    O conceito de crise, normalmente entendido como uma situação negativa, se analisada em sua origem na palavra grega Krisis, significa um momento de mudança e de decisão que pode tornar a vida muito melhor. É bom lembrar que no final da grande crise de 1929 a 1945, crise que lançou o mundo num caos, o mundo aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos e implantou o Plano Marshall, que recuperou a economia da Europa e lançou as bases para o desenvolvimento dos países do Terceiro Mundo. As crises globais deste começo de século XXI podem ser o novo tempo de implementação dos direitos humanos globais e sociais no Brasil e no mundo. Os cidadãos, os advogados, a defensoria pública, o ministério público, os juízes, todos nós somos convocados para a efetivação os direitos sociais previstos na Constituição. A construção de um mundo melhor depende de todos nós.



    VII - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



    BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 1. ed. Saraiva: 2008.

    BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política.

    BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

    FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direito Constitucional do Trabalho. Ed. Ltr: 1991.

    MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

    RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral. 8. ed. Rio de Janeiro: Impetus: 2008.

    SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional. 31. ed. Rio de Janeiro: RT, 2007.

    VIANNA, Luiz Werneck et al. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1999.
  2. Fernando Zimmermann

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