Contradição Entre Incisos

Discussão em 'Direito Constitucional' iniciado por nakid, 25 de Junho de 2009.

  1. nakid

    nakid Em análise

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    Olá Pessoal! Tudo bem?

    Minha dúvida é sobre 2 incisos do Artigo num. 5 que fala sobre os DIRETOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS E COLETIVOS

    O inciso LIV diz:
    ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal

    Aqui entendo que a prisão de uma pessoa só poderá ser imposta após um processo judicial.


    O inciso LXI diz:
    ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei

    Aqui já entendo, desconsiderando o que é dito da parte militar, que a prisão de alguém só poderá ser feita se a pessoa por pega cometendo um crime ou por mandado judicial.


    Pra mim, os textos dos dois incisos deixa claro que as condições são "se e somente se". Dessa forma eles dizem coisas diferentes sobre um mesmo assunto.

    Alguém pode me posicionar um pouco melhor a respeito deste assunto?

    Agradeço antecipadamente.
  2. Fernando Zimmermann

    Fernando Zimmermann Administrador

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    Na hermenêutica jurídica não há contradição, os dois incisos se complementam.

    A Constituição deve ser interpretada como um todo harmônico, de maneira que uma disposição sua não exclui a outra. Essa contradição é aparente.

    Um artigo ou inciso do texto Constitucional não pode ser interpretado isoladamente; ele encontra seus limites em outro artigo ou inciso.

    Assim, quando o inciso LIV do art. 5º diz que "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal", e o inciso LXI diz que "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei", eles estão se complementando, colocando balizas sobre a forma de aplicar a lei.

    Pense na Constituição como alguém iniciando uma conversa, cuja idéia final você só obterá ao final. Cada artigo da Constituição é uma frase dessa conversa.

    Desta forma, conjugando os dois incisos, a regra que você extrai é a seguinte:

    "Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal E NÃO EXCLUINDO QUE ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei."

    Abraços,
  3. fmbaldo

    fmbaldo Editores

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    Apenas para completar as palavras do colega Fernando Zimmermann, tenha sempre em mente o seguinte:

    A interpretação literal da CF é sempre a mais pobre, ou seja, não podemos aplicar as regras constitucionais ao "pé da letra";

    Também não existe letra morta na CF, abrindo margem portanto para a integração das normas.

    Apenas para citar um exemplo disso tudo: O art. 5º caput diz:

    "Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:"

    Vou destacar uma parte dele: "garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida"

    Analisando literalmente o art. 5º teriamos uma situação de homicídio que poderia ocorrer: a do estrangeiro em trânsito pelo Brasil, pois o mesmo não é Brasileiro nato, nem é residente no páis.

    Espero ter sido claro.
  4. nakid

    nakid Em análise

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    Fernando Zimmermann e fmbaldo,

    Muito obrigado pelas explicações.

    Agora está tudo muito mais claro.

    Grande abraço.
  5. Rodrigo drévix

    Rodrigo drévix Membro Pleno

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    Aproveitando o tópico, mas observando a ótima explicação dada por Fernando Zimmermann e fmbaldo, ponho à vista, respectivamente, os art. 61, § 1º, inciso II, alínea d e art. 68, § 1º, inciso I:

    "São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que disponham sobre a ORGANIZAÇÃO do MINISTÉRIO PÚBLICO e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios."

    "As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional. Não serão objeto de delegação...a legislação sobre a ORGANIZAÇÃO do Poder Judiciário e do MINISTÉRIO PÚBLICO, a carreira e a garantia de seus membros."

    Então, a pergunta que se faz é como não será delegada uma coisa que a própria CF, anteteriormente, considera privativa do Presidente da República?

    Mas fica claro, ao meu ver, que não se pode delegar a legislação sobre a organização do Ministério Público, pois ela já é de direito do Presidente da República.

    Alguém dispõe em contrário ao meu entendimento? Por favor, poste sua opinião, correção ou o que seja.
  6. Fernando Zimmermann

    Fernando Zimmermann Administrador

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    Boa pergunta. Não consegui visualizar qual a utilidade ou como encaixar o art. 68, § 1º, I da CF, quando confrontado com o art. 61, § 1º, II, d.

    CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
    Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
    § 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:
    II - disponham sobre:
    d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;


    Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.
    § 1º Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre:
    I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;



    Apesar de estranho, não vejo como discordar disso.
  7. guifioreze

    guifioreze Em análise

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    O artigo 68 determina que o Presidente não pode delegar a iniciativa de lei sobre organização do Ministério Público.
    Entendo isto.
  8. DeFarias

    DeFarias Membro Pleno

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    Uma coisa é a prerrogativa de criar a lei. Outra é a de iniciar o processo legislativo. No caso, somente o Presidente tem a competência para iniciar o processo de criação de lei que trate dessa matéria, mas a prerrogativa de criá-la é do Congresso Nacional.

    Logo, a Constituição veda a delegação da competência de criar a lei que trate dessa matéria.
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