Direito À Informação X Direito À Privacidade

Discussão em 'Direito Constitucional' iniciado por IRON LAW, 31 de Agosto de 2010.

  1. IRON LAW

    IRON LAW Membro Pleno

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    Com a “eletronização” crescente da vida moderna, cada vez mais se discute a questão do direito à informação X direito à privacidade (o recente tópico sobre registro de domínios .com.br é um exemplo disso). Penso que, em breve, tal assunto precisará ser debatido, seriamente e de forma genérica, por nossos legisladores. Abaixo, uma interessante entrevista relacionada a esse tema:

    “Presidente da OAB fala sobre sigilo bancário

    No dia 25 de janeiro, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a Lei Complementar 105/2001, que permite ao governo acessar dados sobre movimentações financeiras dos contribuintes.

    O presidente do Conselho Federal da OAB, Cezar Britto, fala ao LivreAcesso sobre a Adin e defende a quebra do sigilo bancário dos funcionários que lidam com dinheiro público. Britto também defende a abertura dos documentos da ditadura militar.

    O direito à informação inclui o direito de acesso, pelo governo, aos dados bancários dos contribuintes?

    A Constituição Federal de 1988 estabelece princípios fundamentais de proteção ao cidadão. Entre eles está o de proteger o sigilo da fonte, para os jornalistas, o sigilo de defesa, entre cliente e advogado, o sigilo telefônico, de correspondência, e também o sigilo bancário, para que a movimentação financeira do cidadão não seja instrumento de chantagem e pressão política, como ocorria durante o período de repressão. Pois bem, o artigo 5o da Lei 105 permite a quebra do sigilo das movimentações financeiras sem ordem judicial, o que não é permitido pela Constituição. A Instrução Normativa (Instrução Normativa 802, da Receita Federal, que determina às instituições financeiras que apresentem informações sobre todas as contas de pessoas físicas que movimentam acima de R$ 5 mil e de pessoas jurídicas, acima de R$ 10 mil, por semestre) padece de vício de origem, pois está baseada na lei que autoriza a quebra do sigilo da movimentação financeira sem ordem judicial.

    Por que as informações bancárias dos contribuintes devem ser consideradas sigilosas?

    O sigilo bancário evita que o Estado tenha acesso a essas informações e faça delas um instrumento de pressão politica, como se fazia no passado, durante a repressão. Mas veja bem: a OAB apóia a flexibilização do sigilo bancário em casos específicos, como por determinação judicial. Outro exemplo é para quem exerce cargo público e tenha relação com a movimentação de dinheiro público, que deveria ter sua movimentação financeira fiscalizada. Assim, quem se candidatar terá que colocar suas contas à disposição das autoridades fiscalizadoras. Hoje a lei já determina isso para alguns cargos públicos, como o presidente da República e os governadores. Mas isso poderia ser ampliado para outros cargos, como prefeitos, vereadores e vários outros cargos que dêem acesso ao dinheiro público.

    Uma corrente defende que haveria interesse público na fiscalização do recolhimento de impostos, por isso a Receita Federal teria o direito de acessar os dados bancários dos contribuintes. A Advocacia-Geral da União vem defendendo que o acesso a esses dados seria importante para combater crimes como corrupção e lavagem de dinheiro...

    O combate ao crime não justifica todo e qualquer ato. Não justifica a quebra do sigilo da fonte, a quebra do sigilo telefônico, do sigilo de correspondência, do sigilo bancário. São direitos fundamentais do cidadão que foram conquistados ao longo do tempo e têm que ser respeitados.

    Como conciliar o direito à privacidade e o direito à informação?

    O direito à informação aparece como proteção ao cidadão. O Estado tem que respeitar esse direito. Mas isso não diz respeito à informação privada. O direito à informação tem seus limites, como o respeito à privacidade e à imagem. O Estado tem que zelar pela privacidade das pessoas. São vários princípios que estão a proteger o cidadão contra o fortalecimento excessivo do Estado.

    Como a questão do sigilo bancário é tratada em outros países?

    Este é um debate que divide o mundo. Em alguns países existe sigilo total, e em outros, abertura total. O Brasil adotou o meio termo, ou seja, a flexibilização do sigilo bancário, que pode ser quebrado mediante autorização judicial ou mediante autorização prévia, como no caso de algumas autoridades públicas. É uma legislação conciliatória, que não segue nem o absolutismo nem a liberação geral.

    O artigo 145 da Constituição Federal diz, em seu parágrafo primeiro, que, "sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte". Esse dispositivo não autorizaria o governo a acessar os dados bancários de todos os contribuintes?

    O Estado pode fiscalizar e tem o dever de fiscalizar. Havendo indícios, a autoridade fiscalizadora pode pedir a quebra do sigilo, mas pela via judicial. Aliás, o Judiciário não tem negado a quebra do sigilo quando há indícios, o Judiciário tem corretamente mandado abrir. O Estado tem meios de investigar, há dados de Imposto de Renda, testemunhas... Não há nenhum empecilho para a investigação, mas sim um controle do Estado para que não haja um fortalecimento excessivo do Estado.

    Existe uma confusão sobre o que deve ser informação sigilosa no Brasil? A Adin apresentada recentemente pela OAB contra as leis 11.111/05 e 8.159/91, que tratam do sigilo de documentos, pede que informações atualmente classificadas como sigilosas sejam abertas ao público.

    O Brasil tem o direito de saber o que aconteceu com o Brasil. É uma dívida que este e outros governos têm com a população brasileira. Anistia não é sinônimo de amnésia. Temos que saber o que aconteceu para não repetir o que ocorreu durante a ditadura. Por isso a OAB, além de pedir a abertura dos arquivos da ditadura, entrou com uma ação judicial contra a lei que estabelece a possibilidade de sigilo desses documentos.

    Qual a forma legítima de se definir o que é informação sigilosa?

    O que importa para a segurança nacional deve ser mantido em sigilo. Mas o que importa para o Brasil, não.

    Quem teria legitimidade para decidir isso?

    Teria que ser criada uma comissão insuspeita, com membros do governo e da sociedade. O sigilo pode ser analisado por assunto ou em relação a cada solicitação.”

    http://www.livreacesso.net/tiki-read_article.php?articleId=223
  2. wellington.osorio

    wellington.osorio Em análise

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    Caros Colegas,
    Coloco neste tópico uma questão ainda de maior preocupação, trata-se da crescente disponibilização na internet de decisões do próprio judiciário, entre elas inclusive as que tratam de segredo de justiça, outras ainda desatualizadas ou com nomes trocados, que estão a gerar vexame e constrangimento aos jurisdicionados.
    Note-se que a Lei Penal impõe duras penas à difamação, mas, e quando a informação difamente vem do Poder Judiciário? - o que se deve fazer?
    Bom, neste caso, deve-se eleborar uma petição de Reclamação ao Conselho Nacional de Justiça, e tentar compensar os danos morais e materiais sofridos em ação própria, onde a questão seria dirimida pelo mesmo órgão que a perpetuou, muitas vezes expressamente por meio de portarias internas.
    O assum é sério e merece a maior atenção e vigilância!!!
    Um forte abraço a todos,
    Wellington Osório





  3. tiagod

    tiagod Membro Pleno

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    Aproveitando o assunto em questão, aqui no Rio Grande do Sul foi descoberto que um sargento, a mando de um coronel da BM, acessava dados sigilosos de políticos, jornalistas e policiais.
    Como ocorreu há poucos dias com a filha de José Serra, trata-se de mais um episódio de total desrespeito ao direito constitucional da privacidade das pessoas.

    O sistema de dados sigilosos, denominado "Consultas Integradas", é acessado por nada menos do que 49 (quarenta e nove) órgãos, segundo o Secretário de Segurança Pública do Estado. Ainda, segundo ele, " O acesso é feito por pessoas credenciadas, a pedido de diferentes chefias. O Detran usa, a prefeitura usa, a Polícia Civil... Enfim, tem várias entidades."

    Bem, ficou clara a total falta de critérios de concessão de uso e de controle na utilização do sistema. Se um servidor do Estado mal intencionado quiser pesquisar os dados de um desafeto seu lá fora, por exemplo, poderá perfeitamente transformar a vida dessa pessoa num verdadeiro inferno!

    Nem mesmo a Governadora do Estado escapou da espionagem, assim como várias outras autoridades políticas.
    Enfim, qualquer pessoa que possua uma senha para operar esse sistema pode consultar dados sigilosos de qualquer cidadão, num simples clique de mouse! E, diga-se de passagem, não são poucas as pessoas que têm acesso ao sistema, já que, como dito acima, quarenta e nove órgãos do Estado estão credenciados a utilizar o sistema. Isso é um absurdo sem tamanho...
  4. rviriato

    rviriato Membro Pleno

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    Caros colegas,

    Aproveitando o tema levantado por nosso amigo Iron Law (saudações, meu camarada!), gostaria de compartilhar e ouvir as sugestões dos colegas sobre um caso que me apareceu hoje mesmo, pela manhã.

    Trata-se do caso de uma pessoa que recebe na caixa de entrada de seu e-mail algumas mensagens informando que a mulher de seu colega o está traindo. Ele conta o fato ao colega, que fica inconformado e desconfiado. Ambos procuram um meio de descobrir quem enviou a mensagem para, posteriormente, responsabilizar o indivíduo.

    Os colegas concordam que existe direito à informação, sendo possível ajuizar ação requerendo que o provedor do serviço de e-mail apresente os dados do indivíduo que enviou as mensagens (principalmente, o IP para rastreamento do sujeito)? Além disso, acham que a ação cabível seria uma Cautelar de Exibição de Documentos?

    O que acham?
  5. IRON LAW

    IRON LAW Membro Pleno

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    Olá, Raphael.
    No caso exposto por você, a discussão não é de direito à informação X direito à privacidade, que surge quando alguém, sem ter cometido falta alguma, tem sua intimidade violada por ser isso supostamente necessário ao bem-estar coletivo. Exemplo: alguns defendem que os funcionários que lidam com dinheiro público não devem ter privacidade bancária, mesmo que esses funcionários não tenham feito nada de errado. Esse é um caso em que cabe o debate “direito à informação X direito à privacidade”. Nessa questão do e-mail relatada por você, estamos diante de outra coisa: um atentado à honra de alguém. Assim, para que o autor desse atentado pague por seu ilícito, a Justiça pode exigir que o responsável pela ferramenta utilizada para concretizar a ofensa (no caso, o provedor do serviço de e-mail) revele a identidade do ofensor. Nesse caso, não haverá a violação da privacidade do agressor, mas apenas uma busca por ele para que sofra as consequências jurídicas de seu ato.
    Abraços.
  6. rviriato

    rviriato Membro Pleno

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    hmmmm... esclarecimento interessante. Obrigado, Iron Law.

    Como sempre, os colegas aqui são muito prestativos.


    Abraços!
  7. OctavioCesar

    OctavioCesar Membro Pleno

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    Estados Unidos querem facilitar o monitoramento da internet, diz jornal

    Os Estados Unidos estudam a criação de novas regulamentações para a internet que vão permitir que as leis e os agentes de segurança do país possam vigiar com mais ênfase as atividades no meio on-line. De acordo com o jornal “The New York Times”, as autoridades justificam as medidas, que em tese permitirão “grampear” usuários por conta das dificuldades de grampear terroristas e outros criminosos que usam a web para se comunicar e preparar planos de ataque. Entre as novas regulamentações, o Congresso norte-americano pede que todos os serviços on-line, desde redes sociais como o Twitter e o Facebook, troca de e-mails encriptados como os do BlackBerry, programas de comunicação como Microsoft Messenger e o Skype, por exemplo, possam ser grampeados caso necessário. É solicitado, ainda, que todos estes programas permitam interceptar e interpretar mensagens encriptadas.

    A proposta será enviada ao Congresso apenas em 2011, mas já provoca polêmica por conta da privacidade dos usuários destes serviços. O jornal afirma que o equilíbrio entre a segurança nacional e as questões de privacidade será abalado e que a medida poderá ser copiada em escala global, pois muitos países enfrentam os mesmos problemas de segurança na rede.

    Em entrevista ao “The New York Times”, o vice-presidente do Centro de Democracia e Tecnologia dos EUA, James Dempsey, disse que esta mudança causaria “grandes implicações na internet, mudando elementos fundamentais da revolução da rede como o seu design descentralizado”. “Eles querem voltar o relógio no tempo e fazer com que a internet funcione como o telefone comum”.

    Em contraponto, agências de segurança do país afirmam que o “grampo” será feito apenas com autorizações legais.

    O projeto de lei, que membros da administração Obama pretendem submeter ao Congresso ano que vem, adiciona novos capítulos ao debate sobre os limites entre a privacidade e as necessidades de segurança da internet. Na realidade, já há uma lei nos Estados Unidos que obriga operadoras de telefone e Banda Larga a manter capacidades de interceptação, sob uma lei de 1994 chamada “Communications Assistance to Law Enforcement Act”. A lei permite que, em alguns casos, investigadores obtenham mensagens criptografadas quando quiserem. Contudo, em algumas ocasiões, é necessário que as autoridades intimem a empresa que oferece os serviços para decodificar as mensagens.

    Com isso em vista, a proposta agora é obrigar todos os fornecedores de serviços a desenvolverem tecnologias que permitam a decodificação imediata de mensagens. O projeto se expande para operadoras que fornecem serviços para fora do país, como a RIM, que recentemente entrou em conflito com os governos de Dubai e da Índia por não ter a capacidade de decodificar as mensagens enviadas pelo seu serviço de mensagens codificadas.

    Fontes: G1 | Opinião e Notícia | The New York Times
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