A Descriminalização Do Aborto

Discussão em 'Direito Penal e Processo Penal' iniciado por Caio Mathias, 13 de Abril de 2010.

  1. Caio Mathias

    Caio Mathias Em análise

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    Bom dia, colegas.
    Através deste tópico, pretendo discutir com vocês um assunto um tanto quanto temeroso: O Aborto.

    Tendo ciência de que este fórum é frequentado por profissionais sérios e pessoas abertas à ler e discutir opiniões sem apelar à exaltações, exponho o seguinte:

    Embora nossa legislação criminalize o aborto, pouco foi discutido a este respeito. Tal fato é compreensível, afinal, trata-se de um terreno acidentado, onde poucas pessoas se atrévem a pisar, em parte, por conta da própria legislação. Confuso? Explico! A sociedade não precisa pensar à respeito do que já está legislado, ou seja, criou-se um estado de conforto sobre o tema. "É criminalizado, portanto, imoral. Ponto!" - Não é bem assim que a sociedade deveria pensar. O aborto deveria ser amplamente discutido e, independente das posições religiosas, deveria-se observar também os argumentos a seu favor.
    Confuso novamente? Posso enumerá-los:

    1- Estudos feitos nos EUA, atribuíram ao caso Roe vs Wade - que, nos anos 70, permitiu a realização do aborto, independente do motivo, em todo o território nacional - a drástica queda na criminalidade nos anos 90. A explicação é simples:
    Os potenciais criminosos dos anos 90, jovens pobres, de famílias desestruturadas e sem acesso à educação, simplesmente não nasceram nos anos 70.
    Sendo um pouco mais dramático, filhos amados e desejados por suas famílias não foram assassinados por filhos que não tiveram a mesma sorte ao vir ao mundo.

    2- Proporcionalmente falando, há mais mortes ligadas ao parto do que ao aborto. Isso porque o procedimento abortivo é muito mais simples do que as pessoas imaginam. Na verdade, até o terceiro mês de gestação, tal procedimento é feito apenas pela ingestão de uma pílula.
    Logo, uma mulher deveria aceitar maiores riscos por um filho que ela não quer?

    3- Cada pessoa é dono de seu próprio corpo, portanto, uma mulher não deveria a ser obrigada a carregar por nove meses em seu ventre algo que ela não quer. Duro, porém verdade!

    4- As religiões devem ser deixadas de lado no debate, pois nosso estado é LAICO, independente de religiões. Ora, a única entidade que acredita que a vida começa na concepção é a igreja católica. Cientificamente, o consenso é... Não há consenso! - Mas nenhum médico, cientista ou biólogo afirma que a vida começa na concepção.
    Portanto, se o Brasil é laico, qual é o sentido de submeter o assunto às pressões de uma entidade religiosa? Cada indivíduo deve ser livre para refletir e tirar sua própria conclusão sobre o tema, decidindo, assim, se é ético e moral ou não e tomar suas atitudes de acordo com suas convicções. Mas a lei simplesmente não deveria ter o direito de tirar essa decisão do indivíduo.

    Desde já, grato pela atenção de todos.
  2. Ribeiro Júnior

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    Tem certeza disto?

    Mais tarde retornarei para responder com mais calma. Agora, tenho que terminar um prazo "daqueles".


    Cordialmente,
  3. Caio Mathias

    Caio Mathias Em análise

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    Rsrs. Boa sorte, Ribeiro!

    Realmente, talvez eu tenha sido drástico demais ao afirmar que nenhum cientista considera a concepção como início da vida.

    O que acontece é que a polêmica entre as definições de início e fim da vida é enorme e, provavelmente, perdurará anos sem uma resposta definitiva. Porém, tendo a comunidade científica mundial aceitado a morte cerebral como momento do fim da vida, considera-se que o mesmo conceito serviria para a definição do início da vida.

    Grande abraço a todos.
  4. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Então, Mathias:

    Imagino que as implicações do colega sejam a margem da utilização do abortamento como método contraceptivo, certo? Certa feita escrevi um artigo científico sobre o referido tema.

    Não pretendo adentrar nos pormenores das aplicações do abortamento e seus fins, como o terapêutico, o eugênico e o contraceptivo. Vou tentar ficar apenas neste.

    O Direito à Vida contrapõe-se diretamente a faculdade de realizar ou não o abortamento. Ademais, a utilização das técnicas de aborto como método contraceptivo, além de uma discussão jurídica, consiste num debate hodierno e constante acerca das políticas públicas em torno da Saúde. Destarte, não há que se afastar das condições orçamentárias, além da moral de toda a sociedade, para tratar-se da matéria em voga. Assim, abortar ou não, além de uma faculdade, ou de uma questão religiosa, social, moral ou de gênero, é – principalmente – um aspecto administrativo de política pública e efetivação do acesso de todos os segmentos da população ao serviço público de saúde: os custos de prevenção ainda são mais atrativos ao orçamento do governo do que os gastos posteriores.

    No direito brasileiro e na codificação ética vigente, o aborto deixa de ser ilícito apenas quando feito pelo médico, para salvar a vida da gestante ou para evitar o nascimento de uma criança gerada por meio de estupro. No entanto, algumas decisões judiciais, em locais diferentes, autorizaram recentemente o aborto em casos de anencéfalos. Mesmo não sendo considerados eugênicos, nem suficientes para criarem uma jurisprudência, isso certamente será um precedente quando outros magistrados se pronunciarem em casos semelhantes.

    Compreendendo a livre escolha no que tange ter ou não filhos, entende-se também que existem diversos métodos que evitam a gravidez indesejável tais como: coito interrompido, uso de preservativos, uso de pílulas anticoncepcionais, vasectomia e outros que atuam em evitar a fecundação do óvulo, assim, a vida não foi gerada. Pensando no aborto, este fere a Declaração Universal dos Direitos Humanos, pois o direito a vida é de extrema importância, no momento que se implementa o aborto, uma vida está sendo ceifada. O aborto acontece depois que o óvulo foi fecundado, ou seja, este método não pode ser considerando contraceptivo.

    O aborto é prática repulsiva que transgride o respeito à vida humana pois, fora dos casos de gravidez resultante de estupro e para salvar a vida da gestante, o bem-jurídico vida está sendo tratado com irreverência e invelecimento.

    Admita-se, ainda, que nos países que adotam o aborto livre, apenas uma pequena parcela dos médicos defensores e praticantes do abortamento seja consciente e honesta. A maioria, bem significativa, o faz por interesses meramente financeiros.

    Assim, legalizado o aborto, estariam todos os obstetras disponíveis à prática abortiva? Ninguém pode ser violentado na sua consciência. Ainda mais: os professores de obstetrícia estariam no dever de colocar no currículo de ensino de sua especialidade, não apenas os conhecimentos na assistência à gestante e ao feto, mas, também, conhecimentos de como matar com mais eficiência e destreza o embrião humano? E possível conciliar uma medicina que cura com uma medicina que mata? Onde levantaríamos o limite de dispor de uma existência? Ao que nos consta, a medicina sempre contou com o mais alto respeito humano pelo irrestrito senso de proteção à vida do homem e não como instrumento de destruição. Fora disso, é distorcer e aviltar a sua prática, a qual deve inclinar-se sempre ao bem do homem e da humanidade, prevenindo doenças, tratando dos enfermos e minorando os sofrimentos, sem restrições ou sem discriminações de qualquer natureza.

    Logo, na dúvida sobre quando dá-se o início da vida, conforme mesmo salientou o colega, acredito que àqueles que ainda estão por vir é devido o benefício da dúvida. A única certeza que eu tenho nesta seara é que antes da concepção não há vida organizada, mas apenas expectativa; quando esta expectativa materializa-se em vida, é algo para os cientistas da biologia estudarem e debaterem. Então, até que se prove qual é o início da vida, vamos proteger-la, como bem-mor a ser tutelado pelo Direito e pela Justiça.


    Cordialmente,
    Fernando Zimmermann curtiu isso.
  5. alogicadodireito

    alogicadodireito Em análise

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    Uma mulher
    chega apavorada no consultório de seu ginecologista e diz:
    - Doutor, o senhor terá que me ajudar num problema muito sério.
    Este meu bebê ainda não completou um ano e já estou grávida novamente.
    Não quero filhos em tão curto espaço de tempo, mas num espaço grande entre um e outro...

    O médico então perguntou:
    Muito bem. O que a senhora quer que eu faça?

    A mulher respondeu:
    Desejo interromper esta gravidez e conto com a sua ajuda.

    O médico então pensou um pouco e depois de algum tempo em silêncio disse para a mulher:
    Acho que tenho um método melhor para solucionar o problema.
    E é menos perigoso para a senhora.

    A mulher sorriu, acreditando que o médico aceitaria seu pedido.

    Ele então completou:
    Veja bem minha senhora, para não ter que ficar com dois bebês de uma vez, em tão curto espaço de tempo, vamos matar este que está em seus braços.
    Assim, a senhora poderá descansar para ter o outro, terá um período de descanso até o outro nascer.
    Se vamos matar, não há diferença entre um e outro.
    Até porque sacrificar este que a senhora tem nos braços é mais fácil,
    pois a senhora não correrá nenhum risco...

    A mulher apavorou-se e disse:
    Não doutor! Que horror! Matar uma criança é um crime.

    Também acho minha senhora, mas me pareceu tão convencida disso, que por um momento pensei em ajudá-la.

    O médico sorriu e, depois de algumas considerações, viu que a sua lição surtira efeito.

    Convenceu a mãe que não há menor diferença entre matar a criança que nasceu e matar uma ainda por nascer, mas já viva no seio materno.





    A LÓGICA DO DIREITO
  6. tiagod

    tiagod Membro Pleno

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    Boa noite!

    Bem sucintamente, sei que alguns doutrinadores brasileiros consideram o início da vida a partir do funcionamento do aparelho cárdio-respiratório, que é aferível por um exame chamado docimasia hidrostática de galeno. Então, segundo essa corrente, se restar comprovado que houve batimento cardíaco e troca de oxigênio, considera-se a existência de vida! Esse exame é feito após a expulsão do feto do ventre da mulher, claro, em uma série de etapas, utilizando-se as vísceras do mesmo.
  7. Ribeiro Júnior

    Ribeiro Júnior Membro Pleno

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    Prezado Thiago,


    Acredito que esta corrente apontada pelo colega já encontra-se há muito superada, haja vista que apenas indicará se a criança nasceu e morreu em seguida ou é o caso de um natimorto. O que se debate aqui é quando se deve considerar o início da vida (leia-se expectativa de viver) e o momento em que este direito deve ser tutelado pelo Direito. Alguns dizem que inicia-se na nidação, outros na concepção, ainda mais alguns dizem que a partir do quarto mês de gravidez, ainda há quem afirme que inicia-se a partir das primeiras sinapses, dentre outras inúmeras teses. A tese de que a vida começa a partir do parto, entendo particularmente, que encontra-se superada - haja vista a própria tutela jurídica que criminaliza o abortamento.

    Com certeza, a Docimásia Hidroestátita de Galeno é um exame bastante usado e de longa data conhecido da medicina legal. Contudo, não nos presta mais imaginarmos que a vida acontece apenas após o parto com vida. Antes disto já há vida intra-ulterina. A psicologia, por exemplo, diz-nos que há reflexos na nossa psique das experiências vividas neste período. Portanto, não é razoável retornarmos a este período do Direito que negligenciava a vida intra-ulterina.

    No entanto, o debate sobre o início da capacidade civil de ser titular de direitos é uma outra situação. Talvez, aí sim, nosso Código Civil ainda adota esta teoria - de que a capacidade civil se inicia com o nascimento com vida, e antes disto há apenas expectativa de direito.


    Cordialmente,
  8. tiagod

    tiagod Membro Pleno

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    Colega Ribeiro, muito boa sua explicação!Mas o que eu quis dizer foi exatamente isso, que para essa corrente existirá vida (vida intra-uterina) se restar comprovado que o aparelho cardio-respiratório do feto funcionou! E é fato também que a doutrina majoritária considera que o feto já é detentor de direitos personalíssimos, como o direito aos alimentos. Inclusive, se não me engano, já há uma lei que dispõe sobre os alimentos ao nascituro.Como você expôs acima, a tese de que a existência da pessoa humana começa apenas quando do nascimento com vida resta superada, visto que nosso Direito tutela os direitos do nascituro desde a concepção (CC, Art. 2º). Aí é que surge o debate quanto à existência da personalidade jurídica! Segundo a Teoria Concepcionista, que é a adotada pelo Código Civil Brasileiro, o nascituro tem seus direitos resguardados desde a concepção, sendo que os direitos patrimoniais são adquiridos após o nascimento com vida.Enfim, creio que no Direito pátrio está consolidado que o feto é titular de direitos já na vida intra-uterina, mas realmente há inúmeras teses sobre quando se dá o surgimento dessa vida intra-uterina, que é quando passa-se, então, a produzir efeitos jurídicos aqui fora.Att,
  9. tiagod

    tiagod Membro Pleno

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    PS: Separei os comentários por parágrafos, mas apareceram esse símbolos (<BR><BR>)onde eu dei enter! Por que isso acontece?
  10. Fernando Zimmermann

    Fernando Zimmermann Administrador

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    Saudações Thiago_RS,

    Talvez isso esteja acontecendo em razão do navegador que você está utilizando. Sabe dizer qual é e qual a versão?

    De qualquer forma, para resolver, clique em seu nome no topo da página, e no menu que aparecerá, selecione a opção "Painel de controle", ou diretamente nesse link.

    Na tela que se abrirá, desmarque a opção "Habilitar editor RTE?", e em seguida clique em "Salvar alterações", que seu problema será resolvido.
  11. tiagod

    tiagod Membro Pleno

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    Saudações, Fernando!Uso o Internet Explorer 8. Já desmarquei aquela opção, conforme sua instrução_Obrigado!
  12. alogicadodireito

    alogicadodireito Em análise

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    Caro Colega Ribeiro

    Estamos inteiramente do seu lado, e apoiamos plenamente os argumentos apresentados por sua banca. Sem mais comentários.
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