Se um juiz brasileiro fosse analisar hoje a conduta de Adão e Eva, a sentença seria mais ou menos assim:
"Trata-se de ação visando a condenação de Adão e Eva, consistente na expulsão do Paraíso, em razão de terem os réus comido da fruta proibida, após proibição já declarada na Lei.
Confessam os réus a realização da conduta proibida, afirmando que o ato só foi levado a cabo em razão da instigação determinante de Serpente, e se dizem arrependidos.
A conduta criminosa, da qual os réus deveriam se abster de realizar foi declarada previamente pela Lei; os réus agiram de forma contrária a ela; houve dolo no ato, revelado pela intenção de comer o fruto proibido; assim, verificam-se presentes os requisitos do crime.
No entanto, exige a lei penal a declaração prévia não só da conduta criminosa, mas também da pena a qual se submeterá o descumpridor da regra. Princípio basiliar do Direito, encontra seu fundamento em nossa Carta Magna:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 5º.
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;
Do relato apurado, verifica-se que nunca foi exteriorizado pelo Legislador, antes da consumação do crime, que a pena pela conduta de comer do fruto proibido era a expulsão do Éden. Tal punição surgiu posteriormente, sem fundamento em ato anterior declarado na Lei.
Outrossim, sobre a conduta dos réus recaem várias atenuantes. Como é de se observar, lhes foi declarado pelo Legislador que, se cometessem tal crime, adquiririam consciência sobre o bem e o mal. A humanidade sempre buscou, e busca até os dias de hoje um conceito perfeito de bem e mal, sem sucesso. A obtenção de tal ideal resultaria em relevante valor social ou moral, o que deve ser considerado pelo Judiciário.
Além disso, cumpre analisar a conduta de Serpente. Resta bem delineado que a intenção dos réus de cometer o delito somente surgiu após a instigação por parte do meliante Serpente, o qual inclusive é funcionário do Legislador. Usando de tal autoridade, tem-se que o crime foi cometido sob coação a que podia resistir, aparentemente em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção.
Ademais, verifica-se que os réus Adão e Eva confessaram espontaneamente e individualmente seus crimes. Sobre suas condutas, aplicam-se portanto, as seguintes atenuantes:
CÓDIGO PENAL
Circunstâncias atenuantes
Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
[...]
III - ter o agente:
a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;
[...]
c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;
d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;
Por fim, o que mais salta aos olhos, e que configura inclusive abuso de autoridade, é a conduta do Legislador em fazer com que a pena de banimento do Éden seja estendida a todos os seus descendentes, perpetuamente.
Direito Fundamental inscrito na Constituição da República Federativa do Brasil, é o de que somente o autor do fato delituoso responde por seus atos, não podendo quem não o praticou sofrer as consequências de crimes praticados por outrem:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 5º.
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado[...];
Isto posto, CONDENO os réus pela prática do crime tipificado pelo Legislador, consistente na prática de comer do fruto proibido, com as atenuantes descritas.
De outro lado, DEIXO DE APLICAR A SANÇÃO PRETENDIDA, tendo em vista que a pena não havia sido descrita pelo Legislador antes da prática do fato definido como crime.
Por fim, DESCONSTITUO O EFEITO DA CONDENAÇÃO EM RELAÇÃO A TERCEIROS, já que somente quem praticou o crime deve sofrer suas consequências, ficando assim o restante da humanidade absolvida dessa conduta.
Com o trânsito em julgado, lance-se o nome dos réus no rol dos culpados, com a anotação de que não há a pena a ser cumprida.
Oficie-se ao MP, para a averiguação de crime de abuso de autoridade por parte do Legislador.
P.I.R.C.
Brasil, 07 de setembro de 2009, dia da Independência.
Juiz de Direito."
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